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Dessa forma, em comparação com as células normais, as células neoplásicas exibem hipometilação global do DNA, que

pode levar à instabilidade genômica e à hipermetilação em promotores específicos de genes supressores tumorais,

resultando em silenciamento desses genes. Em diferentes tipos de câncer, já foram identificados muitos genes mostrando

essas alterações epigenéticas, como RASSF1, RAR2, DAPK, p16, p15, p53, p14, MGMT, GSTP1, CDKN2A, APC,

BRCA1, MGMT, TIMP3, GSTP.

As alterações epigenéticas podem ser empregadas como marcadores no monitoramento da gênese e da progressão do

câncer e constituem alvos terapêuticos potenciais em virtude de sua reversibilidade. Tratamentos com inibidores da

metilação do DNA podem restaurar a atividade de genes silenciados e diminuir a taxa de crescimento de células tumorais

em um modo herdável. A reversão parcial do fenótipo tumoral pelo uso de inibidores da metilação é, portanto, possível.

Alguns experimentos já realizados com camundongos da espécie Min também têm sugerido que esse tratamento suprime o

desenvolvimento tumoral e pode ser aplicado como uma estratégia de prevenção.

Alterações genéticas e marcadores tumorais

O câncer é uma doença heterogênea, e as múltiplas alterações genéticas e epigenéticas que o caracterizam dificultam sua

prevenção, seu diagnóstico e a terapia. Dessa forma, o estudo do perfil genético molecular dos tumores é necessário para o

entendimento da complexidade da doença, o esclarecimento das bases biológicas e a identificação das melhores estratégias

terapêuticas, pois, apesar dos avanços na quimioterapia, nas técnicas cirúrgicas e nas combinações de medicamentos, há

tipos de neoplasia que não apresentaram melhora de prognóstico nos últimos anos. Muitos eventos relacionados com o

aparecimento de tumores ainda permanecem desconhecidos e, de maneira geral, poucos marcadores moleculares associados

a um grupo de neoplasias estão sendo utilizados na prática clínica habitual. Contudo, com o progresso no conhecimento da

genética molecular e o desenvolvimento de tecnologias mais aprimoradas, surge a oportunidade de identificar novos

marcadores de diagnóstico e prognóstico e novos alvos terapêuticos no câncer.

Atualmente, em Medicina Veterinária têm­se apenas exem­plos de marcadores bioquímicos tumorais, como a lactato

desidrogenase (LDH), a alfa fetoproteína (AFP) e o antígeno carcinoembrionário (CEA). A LDH é uma enzima produzida

pelas células de vários tecidos em condições normais, mas sabe­se que seus níveis podem aumentar significativamente em

condições neoplásicas. Apesar de o LDH ser um marcador inespecífico, sua determinação no sangue pode auxiliar no

diagnóstico e, principalmente, na resposta ao tratamento. A AFP é produzida por hepatócitos fetais, mas não o é por

hepatócitos adultos normais; no entanto, observa­se seu aumento em cães com carcinoma hepatocelular e com

colangiocarcinomas.

A falta de marcadores moleculares na prática veterinária oncológica reforça a necessidade do conhecimento da biologia

molecular em neoplasias de animais, o que contribuirá para diagnóstico e prognóstico mais precisos, assim como para o

desenvolvimento de estratégias terapêuticas mais adequadas e com menos efeitos colaterais.

Morte celular

A reação da célula a qualquer tipo de mudança em suas condições internas ou externas envolve respostas complexas que

eventualmente levam à adaptação celular e à sobrevivência, ou à iniciação e à execução da morte celular. A eliminação de

células é essencial para o processo de embriogênese, no período pós­embrionário e na renovação tecidual, bem como para o

desenvolvimento e funcionamento do sistema imune, agindo na regulação dessa resposta. Antigamente, acreditava­se que a

morte celular era um processo acidental, de caráter degenerativo, que ocorria em situações de estresse celular. Como

consequência, a célula alteraria a integridade da membrana plasmática, aumentando seu volume e perdendo suas funções

metabólicas. Entretanto, nem todos os eventos de morte celular são acidentais. Sabe­se que organismos multicelulares são

capazes de induzir a morte celular programada em resposta a estímulos intra ou extracelulares. Em 1964, foi proposto o

termo “morte celular programada” para designar o processo que ocorre de uma forma não acidental. Existem diferentes

mecanismos de morte celular, como senescência, mitose catastrófica, autofagia, necrose e apoptose, sendo os dois últimos

os principais.

Senescência

Processo metabólico ativo essencial para o envelhecimento. Durante o processo de senescência, a divisão celular é

bloqueada de forma irreversível, mas as células permanecem metabolicamente ativas. A senescência pode ser iniciada pelo

encurtamento dos telômeros ou por algum tipo de estresse. As células em senescência apresentam­se achatadas e esticadas

e ocorre aumento da granulosidade do citoplasma.

Mitose catastrófica

Considerada uma sinalização irreversível para a morte. Trata­se de um processo passivo, porém considerado por muitos

estudos um mecanismo regulado geneticamente. Esse processo resulta da tentativa de divisão de células com DNA

danificado. Dessa forma, caracteriza­se como uma mitose aberrante, o que resulta em uma segregação cromossômica

errônea, determinando assim uma sinalização irreversível para a morte. Durante esse processo, observa­se a presença de

células gigantes, multinucleadas e com cromossomos descondensados.

Autofagia

A autofagia (auto = próprio; fagia = comer/alimentar­se), também denominada morte celular tipo II, é um processo celular

catabólico cujo objetivo é eliminar componentes citoplasmáticos em condições de estresse, como o jejum e a hipoxia. A

autofagia modula a morte celular pela autodigestão excessiva e pela degradação de constituintes celulares essenciais. Este

processo pode ser desencadeado por estresse metabólico ou terapêutico, como o bloqueio de vias de sinalização de fatores

de crescimento, a ativação de vias de sinalização de proteínas quinases ativadas por mitógenos (MAPK), o acúmulo de

cálcio intracelular e de espécies reativas de oxigênio. Durante o processo de autofagia, observa­se a presença de vesículas

autofágicas formadas pela fusão de lisossomos e estruturas celulares.

Necrose

Também chamada oncose, é considerada um tipo de morte celular não programada. Em geral, células necróticas apresentam

vacuolização citoplasmática, ruptura da membrana plasmática, dilatação das organelas (mitocôndria, retículo

endoplasmático e complexo de Golgi) e condensação da cromatina. Quando as células incham e estouram, provocam uma

resposta inflamatória, na tentativa de fagocitar a célula morta (Figura 2.7).

A necrose é geralmente considerada uma morte celular acidental que, ao contrário da apoptose, não é dependente de

energia. Bioquimicamente, durante a necrose ocorrem o esgotamento de energia (adenosina trifosfato – ATP), a formação

de espécies reativas de oxigênio e a ativação de proteases não apoptóticas. Considerando que a ATP é necessária para certos

passos de ativação das caspases, o esgotamento de ATP leva à morte celular por necrose. Além disso, um aumento

substancial do cálcio intracelular é observado durante a necrose. Níveis elevados de cálcio no citoplasma podem provocar

uma sobrecarga mitocondrial, o que leva à despolarização da membrana mitocondrial interna e a uma parada de produção de

ATP. Necrose, no entanto, pode também ser observada em resposta à ativação dos receptores de morte ou à quimioterapia.

Apoptose

Também denominada morte celular tipo I, é um processo fisiológico, conhecido como morte celular programada. Os

primeiros indícios da existência da apoptose foram descobertos em 1972 por Kerr, Wyllie e Currie, o que revolucionou a

compreensão da proliferação celular, da homeostase do tecido e da fisiopatologia de muitas doenças. Nos anos seguintes,

uma série de proteínas envolvidas nas vias de sinalização da morte celular foi identificada, e, 30 anos mais tarde, o Prêmio

Nobel de Fisiologia e Medicina foi atribuído a S. Brenner, H. R. Horvitz e J. E. Sulston por suas descobertas relacionadas

com a descrição dos mecanismos de morte celular (apoptose).

Figura 2.7 Etapas das modificações morfológicas de necrose e apoptose. Adaptada de Grivicich et al., 2007.

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O termo “apoptose” vem do grego; o prefixo “apo” significa separação e o sufixo “ptose” pode ser traduzido como

queda, sendo associado à queda das folhas de uma árvore ou pétalas das flores. Esse termo é uma alusão à liberação de

pequenos corpos revestidos por membrana, resultantes da fragmentação da célula apoptótica, denominados corpos

apoptóticos (Figura 2.8).

A apoptose ocorre ao longo da vida em praticamente todos os tecidos e é essencial para o desenvolvimento do tecido

normal, da homeostase e para os processos patogênicos. O equilíbrio entre a morte celular e a sobrevivência é uma das

principais características da homeostase celular e requer a ação coordenada de proteases e nucleases dentro da membrana

plasmática intacta. Considera­se que a apoptose tenha um papel oposto ao da mitose no controle da proliferação celular.

Atua como uma resposta fisiológica, permitindo a remoção de células ou tecidos alterados, exercendo importante papel na

manutenção da estrutura do órgão ou dos tecidos e impedindo que suas funções sejam alteradas por fatores externos.

Vias de sinalização

A ativação da apoptose pode ser iniciada por meio de duas vias que dependem do local inicial de ativação do processo de

morte celular: via extrínseca (citoplasmática) e intrínseca (mitocondrial).

Via extrínseca

A via extrínseca é iniciada pela ativação dos receptores de morte da superfície celular, capazes de ativar a cascata das

caspases. Os receptores de morte são membros da superfamília dos receptores de fatores de necrose tumoral (rTNF).

Todos os membros dessa superfamília têm domínios ricos em cisteína (CRD), e apenas os receptores funcionais

apresentam domínios de morte (DD). Os membros desta superfamília incluem o Fas/APO1 (receptor ou proteína de

membrana pró­apoptose), o TNFR1/TRAIL­R1 (ligante indutor de apoptose associado ao TNF), ­2(TRAIL­R2),

receptores FasL/APO1/CD95 (proteína de membrana que se liga ao Fas), TRAIL/APO2L e receptores de morte 3, 4 e 5

(DR3, DR4 e DR5).

Figura 2.8 Esquema das vias extrínseca e intrínseca de sinalização da apoptose. Na via extrínseca, a ligação da FADD à

caspase­8 e 10 induz a formação do complexo de sinalização indutor de morte (DISC), que ativa a caspase­3, 6 e/ou 7,

originando a apoptose. A caspase­8 pode ser bloqueada pelo recrutamento de c­FLIP (proteína inibidora de FLICE). O

mecanismo mitocondrial (via intrínseca) ocorre por meio da ativação de membros pró­apoptóticos da família Bcl­2.

Proteínas pró­apoptóticas e antiapoptóticas competem para regular a saída de citocromo C. Se as pró­apoptóticas vencem,

ocorre a liberação de uma série de moléculas do compartimento mitocondrial, principalmente citocromo C, que se associam

ao Apaf­1 e à pró­caspase­9 para formar o apoptossomo. O mecanismo de receptor de morte e o mecanismo mitocondrial

convergem para a ativação da caspase­3. A ativação da caspase­3 é antagonizada pelas IAP, que são antagonizadas pela

proteína Smac/DIABLO liberada pela mitocôndria. A ativação da caspase­3 leva à apoptose da célula. A sinalização e a

integração entre o receptor de morte e a via mitocondrial são feitas pelo BID, um membro da família de moléculas próapoptóticas Bcl­2. A caspase­8 faz a mediação da clivagem da BID, aumentando a atividade de morte celular, resultando

na sua translocação para a mitocôndria, onde promoverá a liberação do citocromo C. Adaptada de Khan et al., 2014.

6

Os domínios ricos em cisteína permitem que os receptores reconheçam seus ligantes, resultando na ativação dos

receptores de morte específicos. Quando os receptores de morte celular reconhecem um ligante específico, os seus

domínios de morte interagem com moléculas conhecidas como FADD (domínio de morte associado ao Fas). Essas

moléculas têm a capacidade de recrutar a caspase­8 e a caspase­10 no citoplasma para formar um complexo de indução de

sinalização (DISC), o qual ativará a caspase­3, a caspase­6 e/ou a caspase­7, executando a morte por apoptose (Figura 2.8).

Via intrínseca

A via intrínseca pode ser estimulada por meio de diferentes sinais de morte, como agentes quimioterápicos, irradiação,

danos no DNA, hipoxia ou ativação de oncogenes e ausência de fatores de crescimento, os quais geram estresse intracelular

ou extracelular, ativando proteínas que induzirão apoptose diretamente pela via mitocondrial. Esta via é regulada por um

equilíbrio entre moléculas pró­apoptóticas e antiapoptóticas da superfamília de proteínas Bcl­2. Os membros da família

Bcl­2 incluem as proteínas pró­apoptóticas (BAX, BAK, Bcl­xS, BAD, BID, BIK, HRK, BIM e BOK), e antiapoptóticas

(Bcl­xL, Bcl­w, BFL­1,BRSAG­1, MCL­1, A1, E1B19K, LMW5­HL e EBV BHRF1). A função principal destas

proteínas é manter a inergridade da membrana mitocondrial externa.

A via intrínseca, quando ativada por estresse celular, leva ao aumento da expressão das proteínas pró­apoptóticas com

domínio “BH­3 only”, como BAD (antagonista de morte celular do Bcl­2), BID (agonista de morte que interage com o

domínio BH3), BIM (mediador da morte celular que interage com Bcl­2), BMF (fator modificador de Bcl­2), PUMA

(modulador de apoptose hiper­regulado por p53) e Noxa (Figura 2.8). Estas proteínas, por sua vez, ligam­se aos membros

antiapoptóticos da família Bcl­2 e inibem suas ações. Um subgrupo de proteína somente com domínios BH­3 inclui

ativadores diretos (BID e BIM), que são capazes de se ligar e inibir proteínas antiapoptóticas, mas também podem ativar

as proteínas efetoras, Bak e BAX. Outro grupo chamado sensibilizador inclui BAD, Noxa e PUMA. Estas proteínas ligamse ao sulco hidrofóbico de proteínas antiapoptóticas Bcl­2, evitando, assim, qualquer futura interação entre as proteínas

antiapoptóticas e pró­apoptóticas. Uma vez que a via é ativada, Bak e BAX formam poros na membrana mitocondrial

externa, levando a sua permeabilização. Isso resulta na liberação de proteínas pró­apoptóticas, como citocromo c e

Smac/DIABLO (segundo ativador mitocondrial de caspase/inibidores diretos da apoptose) para o citoplasma. O citocromo

C forma um complexo com o Apaf­1 (fator de ativação de apoptose 1) e pró­caspase­9,enquanto o Smac/DIABLO liga­se a

proteínas inibidoras de apoptose (IAPs). Essas ligações levam à ativação da caspase­9 e à subsequente ativação da caspase3 e do fenótipo pró­apoptótico (Figura 2.2).

Caspases

As caspases pertencem à família das cisteínas proteases (contêm uma cisteína no sítio ativo), que têm a capacidade de

reconhecer e clivar substratos que tenham resíduos de aspartato. Essas enzimas são específicas para substratos contendo

ácido aspártico, clivando a ligação peptídica seguinte a esse resíduo, e a sua atividade proteolítica deve­se a uma cisteína

polarizada na cadeia lateral. As caspases são sintetizadas na forma de precursores inativos denominados zimogênios e,

quando clivadas, tornam­se enzimas ativas. Foram identificadas 14 isoformas de caspase; dessas, a maioria está envolvida

com o processo de morte, e o restante está relacionado com processo inflamatório.As caspases que estão envolvidas com

apoptose podem ser divididas em dois grupos: as indutoras (caspases­8 e 9), que dão início à cascata proteolítica, e as

efetoras (caspases­3, 6 e 7), que clivam substratos específicos, responsáveis pelas características próprias desse tipo de

morte (fragmentação do DNA, condensação da cromatina, perda de volume e desestruturação do citoesqueleto).

Controle genético

A apoptose é um evento cuja iniciação e as inúmeras alterações celulares, bem como sua inibição, são dependentes da

atividade de genes determinados. As pesquisas sobre o envolvimento de genes no controle da apoptose iniciaram­se com o

nematódio Caenorhabditis elegans. O controle da morte fisiológica nesses organismos é realizado pelos genes da família

CED (cell death abnormal/morte celular anormal): CED­3, CED­4 e CED­9, além de outros genes. Quando o gene

supressor da apoptose CED­9 (homólogo ao gene humano Bcl­2) está associado ao gene CED­4 (homólogo à proteína

Apaf­1), inibe a ativação de CED­3 (pró­apoptótica). Quando a apoptose é iniciada, o indutor apoptótico EGL­1 (homólogo

à proteína humana Bax) se associa ao CED­9, liberando o CED­4 e levando à ativação do CED­3. A indução da apoptose

ocorre quando a proteína Bax se associa ao Bcl­2, induzindo a liberação da Apaf­1 e ativando a caspase­9.

Os genes envolvidos no processo apoptótico podem agir inibindo ou estimulando a apoptose, de acordo com a situação

em que a célula ou o tecido se encontram, e podem ser denominados antiapoptóticos e pró­apoptóticos, respectivamente.

Entre os genes que apresentam ação antiapoptótica, está o grupo Bcl­2(Figura 2.9), enquanto os pró­apoptóticos incluem o

c­myc, o grupo Bax, o grupo BH3­only, o p53 e o Fas (Figura 2.9); esses genes exercem importante função nas células

normais e neoplásicas.

Apoptose e câncer

A apoptose é um eficiente mecanismo na prevenção de uma transformação maligna das células, pois atua removendo as

células com danos genéticos. No entanto, mutações nas vias apoptóticas podem levar à formação de um tumor.

Vários oncogenes e antioncogenes regulam a apoptose. Por exemplo, o aumento na expressão do Bcl­2 impede as células

de iniciarem apoptose em resposta a vários estímulos e, inclusive, confere resistência à morte celular em resposta a agentes

quimioterápicos. Vários tipos de câncer apresentam alta expressão do Bcl­2 ou produtos gênicos relacionados para impedir

a morte celular.

Figura 2.9 Genes anti e pró­apoptóticos.

O supressor tumoral p53, responsável por regular a expressão do Bcl­2, encontra­se alterado no câncer. O p53 se liga ao

DNA e regula a transcrição, ativando ou reprimindo a expressão de vários genes envolvidos na replicação e no reparo do

DNA, conforme descrito anteriormente. Além disso, o produto do p53 é necessário para que a célula inicie a apoptose em

resposta a danos genotóxicos, contribuindo para a supressão do crescimento tumoral. O p53 encontra­se inativo em uma

grande quantidade de tumores, nos quais é observada uma incapacidade das células de sofrer apoptose em resposta ao dano

ao DNA, relacionado a uma maior resistência aos agentes quimioterápicos e à radiação. O p53 também ativa a expressão do

Bax, cuja proteína funciona como um promotor da morte celular. Portanto, em virtude do fato de as proteínas inibidoras de

apoptose estarem superexpressas em vários tipos de câncer, essas proteínas são importante alvo terapêutico.

Angiogênese

A angiogênese é definida como a formação de novos vasos sanguíneos a partir de um endotélio vascular preexistente. Em

circunstâncias fisiológicas controladas, a angiogênese é um processo normal e essencial. Atua na embriogênese, no

crescimento,no aparelho reprodutor feminino a cada ciclo menstrual, na gravidez, no processo de cicatrização e na

sequência de processos inflamatórios.

Em contraste com o processo ordenado, regulado e autolimitado da vascularização normal, a angiogênese patológica é

um processo no qual a multiplicação vascular ocorre de modo descontrolado e contínuo. A angiogênese patológica acontece

em uma variedade de transtornos, como na retinopatia proliferativa, na regeneração macular relacionada com a idade, na

artrite reumatoide, na psoríase, no diabetes melito, no crescimento tumoral e na disseminação metastática.

Fatores pró e antiangiogênicos

O processo angiogênico é regulado por inúmeros fatores pró e antiangiogênicos. Entre esses, o fator de crescimento

fibroblástico (bFGF), que apresenta importante atividade mitogênica e quimiotáxica para células endoteliais, os fatores de

crescimento ligados à heparina, o fator de crescimento derivado das plaquetas (PDGF), o fator de necrose tumoral (TNFα e

TNFβ), moléculas de adesão como as integrinas e as caderinas, o fator de transformação de crescimento (TGFα), as

interleucinas 1, 6 e 8 (IL­1, IL­6 e IL­8), o fator de crescimento endotelial vascular (VEGF), as metaloproteinases

(MMPs), o fator de transcrição induzido por hipoxia (HIF), o ciclo­oxigenase 2 (COX 2) e as angiopoetinas 1 e 2 (ang­1 e

ang­2). Esses fatores são liberados pelas células tumorais, pelas células endoteliais ou pela matriz extracelular e promovem

a formação de novos vasos sanguíneos.

O estímulo angiogênico é acompanhado da supressão dos inibidores locais da angiogênese, denominados fatores

antiangiogênicos, que protegem o endotélio vascular do estímulo proliferativo. Alguns fatores já descritos incluem: fator

plaquetário 4 (PF4), fator de transformação de crescimento (TGF­β), inibidores teciduais das metaloproteinases (TIMP­1,

TIMP­2 e TIMP­3), interferona­alfa (α­IFN), prolactina (fragmento 16 kDa), angiostatina (fragmento 38 kDa do

plasminogênio), trombospondina­1 (TSP­1), interleucina 10 (IL10) e endostatina. Entre as inúmeras moléculas indutoras

da angiogênese, destaca­se o VEGF.

Angiogênese e câncer

Na década de 1970, o pesquisador Judah Folkman

7

foi um dos pioneiros a sugerir que os tumores poderiam recrutar o seu

próprio aporte sanguíneo por meio da produção e da liberação de moléculas estimuladoras da angiogênese. Propôs ainda a

importante participação do desenvolvimento da microcirculação no processo de crescimento tumoral. As ideias de Folkman

se baseavam em estudos de investigadores, como Algire e Chalkley

8

, Greenblatt e Shubik

9

, e Warren

10

, que atribuíam à

angiogênese o pré­requisito para o crescimento neoplásico.

Durante o processo de estabelecimento e progressão do câncer, a angiogênese permite que o tumor tenha sua própria rede

vascular, facilitando o crescimento tumoral e contribuindo para o processo metastático, em virtude do desprendimento de

células neoplásicas no interior dos vasos sanguíneos recentemente formados.

Assim, a formação de novos vasos sanguíneos no tecido tumoral visa ao fornecimento de nutrientes e oxigênio,

permitindo a proliferação das células e o consequente crescimento e a progressão do tumor. Além disso, permite a retirada

do gás carbônico (CO2) e dos resíduos metabólicos e representa uma importante via de disseminação metastática.

Durante seu crescimento, o tumor pode alcançar aproximadamente 1 a 2 mm

3 antes que suas demandas metabólicas

sejam restritas ao limite de difusão de oxigênio e nutrientes no local. A baixa oxigenação é caracterizada como hipoxia e

pode ocorrer por causa da proliferação descontrolada das células e do rápido crescimento do tumor, além de ser

consequência da perfusão inadequada em parte do tecido resultante da estrutura caótica dos novos vasos sanguíneos

formados.

De acordo com a intensidade, a hipoxia pode resultar em apoptose ou induzir respostas adaptativas de sobrevivência

celular. Assim, ao contrário do que ocorre com as células normais, para manter a sobrevivência em situações de hipoxia, as

células tumorais são capazes de promover mecanismos adaptativos, como a indução de fatores envolvidos no processo de

angiogênese.

Fator de transcrição induzido por hipoxia ﴾HIF-1﴿

O fator de transcrição induzido por hipoxia (HIF­1) é essencial na manutenção da homeostase do oxigênio e responsável

por essas respostas adaptativas. O HIF­1 é um fator heterodímero composto de duas subunidades: HIF­1α e HIF­1β. Em

normóxia, o HIF­1β é constitutivamente expresso e o HIF­1α sofre degradação dependente de oxigênio. O HIF­1α é

hidroxilado e, então, reconhecido pela proteína supressora de tumor Von­Hippel­Lindau (pVHL) e ubiquitinilado para

sofrer degradação proteossomal. Em condições de hipoxia, essa degradação não acontece, e então o HIF­1α migra para o

núcleo, associando­se a HIF­1β, atuando como fator de transcrição de diversos genes (Figura 2.10).

O HIF­1α pode regular mais de 100 genes envolvidos nos processos da eritropoese, metabolismo do ferro e da glicose,

proliferação celular, apoptose e angiogênese. Em condições de hipoxia, o principal alvo do HIF­1α é o fator pró­angiogênico VEGF.

Fator de crescimento endotelial vascular

O fator de crescimento endotelial vascular (VEGF) é um potente mitógeno que atua em diferentes etapas do processo

angiogênico, promovendo o aumento da permeabilidade vascular, estimulação da migração, proliferação e invasão de

células endoteliais. Esse fator foi primeiro descrito em células endoteliais e, portanto, denominado “fator de crescimento

endotelial vascular”; no entanto, o VEGF pode exercer ação mitogênica em outros tipos celulares. O VEGF é composto de

uma família de cinco isoformas denominadas VEGF­A, VEGF­B, VEGF­C, VEGF­D e fator de crescimento placentário

(PGF), os quais se ligam a receptores específicos do tipo tirosinoquinase, promovendo uma cascata de eventos

intracelulares.

Cada isoforma pode ativar um ou mais receptores conhecidos, como VEGFR1, localizado na superfície de células

hematopoéticas, macrófagos e monócitos, VEGFR2, encontrado no endotélio vascular e linfático, e o VEGFR3, localizado

predominantemente no endotélio linfático. Receptores de VEGF também são encontrados em células tumorais e podem

estimular o crescimento celular de maneira autócrina.

Figura 2.10 Ativação do HIF­1α em situações de hipoxia e degradação em normóxia. Adaptada de Hoeben et al., 2004.

11

O VEGF­A se liga a dois receptores específicos, o VEGFR1 e o VEGFR2, enquanto o VEGF­B e PGF são

reconhecidos apenas pelo receptor VEGFR1. O VEGF­C e VEGF­D se ligam ao VEGFR2 e também são reconhecidos

pelo VEGFR3 (Figura 2.11). A ligação entre o VEGF­A e VEGFR2 é considerada o mais importante passo do processo de

angiogênese, enquanto a ligação de VEGF­C com VEGFR3 está envolvida no processo de linfangiogênese.

Inicialmente, para o processo de angiogênese, ocorre a ativação de células endoteliais quiescentes por fatores liberados

pelas células tumorais em resposta a condições adversas, como privação de nutrientes e oxigênio. Alguns fatores, como

VEGF e angiopoitina­2, atuam na desestabilização inicial dos vasos preexistentes e no aumento da permeabilidade vascular.

Em seguida, ocorre a degradação da membrana basal e da matriz extracelular, permitindo a migração de células endoteliais

pelo espaço intersticial e a eventual liberação de fatores pró­angiogênicos ligados à matriz. Subsequentemente, ocorrem a

migração e a proliferação de células endoteliais, bem como a formação do tubo, recrutamento e diferenciação de células de

suporte perivascular (pericitos). Nessa etapa, inúmeros fatores estão envolvidos, como VEGF, angiogenina, PDGF, bFGF,

EGF, entre outros. Ao final, ocorrem a maturação e a estabilização dos novos vasos formados, com a participação de

fatores como a angiopoitina­1 e seu receptor Tie­2 (Figura 2.12).

Essas etapas podem ser inibidas por fatores antiangiogênicos como a endostatina ou pelo fragmento derivado do

plasminogênio, denominado angiostatina, os quais podem induzir a apoptose em células endoteliais ou inibir a ativação de

alguns fatores pró­angiogênicos.

Terapias antiangiogênicas ou terapia metronômica

Graças à variedade de sinais envolvidos no processo angiogênico, diversos fatores podem ser considerados alvos

terapêuticos, auxiliando no bloqueio da progressão do câncer. Vários estudos se concentram na inibição da atividade de

VEGF, uma vez que anticorpos anti­VEGF pareceram inibir o crescimento tumoral. A inibição do VEGF via bloqueio de

seus receptores representa um importante enfoque para a terapia contra o câncer, podendo ser utilizada para causar

regressão de vasos sanguíneos imaturos, característicos dos tumores, e reduzir a permeabilidade vascular, de modo a

diminuir a pressão intratumoral, diminuindo, com isso, a probabilidade de metastatização. Além disso, existem estudos

com fármacos inibidores multiquinase, ou seja, que inibem uma variedade de diferentes receptores tipo tirosinoquinase.

Dessa forma, a terapia antiangiogênica pode fornecer um caminho promissor para o tratamento do câncer.

Figura 2.11 Esquema da ligação entre as isoformas de VEGF e seus receptores. Adaptada de Hoeben et al., 2004.

11

Figura 2.12 Representação das etapas do processo de angiogênese com a participação de inúmeros fatores próangiogênicos. Adaptada de Gacche e Meshram, 2003.

12

Metástase

Durante a progressão tumoral, algumas células adquirem habilidade para invadir tecidos adjacentes, desenvolvendo

metástases a distância. Para que esse processo ocorra, são necessárias várias etapas, que incluem perda da capacidade de

aderência da célula, secreção de enzimas que degradam a matriz extracelular, invasão de tecidos adjacentes, sobrevivência

nos vasos sanguíneos e linfáticos e proliferação em locais distantes de sua origem, estabelecendo tumores secundários.

As células do tecido normal têm forte adesão à membrana basal e às células vizinhas. No entanto, as células tumorais

apresentam adesão diminuída, permitindo que se tornem móveis, podendo migrar por meio do estroma e invadir os vasos

sanguíneos e linfáticos. Quando entram na circulação, nem todas as células tumorais conseguem alcançar um novo tecido

para formar metástases. A maioria é destruída por diferentes processos na circulação, como ruptura durante seu percurso,

ataque pelas moléculas de defesa imune e fagocitose por macrófagos. Assim, para garantir sua sobrevivência na circulação,

as células tumorais interagem umas com as outras ou com elementos do sangue, formando êmbolos tumorais

intravasculares.

As células que sobrevivem saem da circulação por meio do parênquima externo, invadindo um novo tecido, onde se

proliferam para formar um novo tumor, distante do original. O crescimento desse novo tumor estimula a angiogênese e os

consequentescrescimento e formação de novas metástases. Normalmente, as metástases não ocorrem em órgãos que não

apresentam condições apropriadas para o crescimento tumoral, assim, frequentemente, acometem órgãos altamente

vascularizados.

Em resumo, para que ocorra a metástase a partir de um tumor primário, a célula neoplásica deve inicialmente se destacar

desse tumor, invadir e migrar os tecidos adjacentes, se infiltrar e sobreviver na corrente sanguínea, aderir e atravessar os

capilares sanguíneos e sobreviver em um tecido estranho ao de sua origem. Para que as células neoplásicas com caráter

metastático possam invadir órgãos distantes, elas necessitam de vias de disseminação.

As vias de disseminação das metástases são principalmente a rede linfática, uma vez que estão presentes em tecido

conjuntivo e apresentam estrutura sensível, sendo considerada a via mais comum para disseminação inicial dos carcinomas.

A via hematogênica também representa uma importante via de disseminação metastática, em vitude da permeação de células

em capilares e vênulas. Os sarcomas, em geral, têm preferência por essa via. Outras vias menos frequentes incluem a linfohematogênica, a canalicular (de ductos envolvidos por epitélio) e a transcelômica (passagem de células neoplásicas por

meio das cavidades serosas que atingem um local distante do primário).

Transição epitélio-mesenquimal

Ao mesmo tempo que as células tumorais se soltam do tumor primário por diminuição da interação célula­célula, elas

devem ter a capacidade de migrar e invadir o estroma adjacente. Assim, células tumorais passam por um processo

denominado transição epitélio­mesenquimal (EMT, do inglês epithelial­mesenchymal transition), caracterizado pela

mudança no fenótipo epitelial para mesenquimal, que leva à perda ou à expressão reduzida dos marcadores de células

epiteliais e ao aumento da expressão de marcadores mesenquimais.

A transição epitélio­mesenquimal é geralmente induzida em células epiteliais por sinais intracelulares, especificamente

enviados pelas células mesenquimais, que constituem o estroma normal e neoplásico dos tecidos. Um evento crítico

molecular subjacente à dissolução dos contatos célula­célula durante a EMT é a diminuição da expressão da E­caderina, um

componente­chave nas junções de adesão. A perda funcional da E­caderina pode ocorrer por meio de vários mecanismos,

mas é frequentemente envolvida com deleção ou mutação do gene CDH1. Além disso, mudanças na expressão de proteínas

que fazem parte do complexo de adesão da E­caderina, como as claudinas e ocludinas, podem prejudicar sua função.

Estudos recentes associam a baixa expressão de E­caderina em tumores mamários caninos com o caráter invasivo do tumor

e metástases em linfonodos. A EMT também envolve a expressão de marcadores mesenquimais, como a N­caderina, a

fibronectina e a vimentina. Essas alterações tornam as células capazes de migrar e invadir o compartimento estromal

subjacente, rompendo a membrana basal (Figura 2.13).

Após o extravasamento e a adaptação em um novo microambiente, as células tumorais podem novamente reverter para

um fenótipo epitelial, permitindo a aderência e a proliferação no novo tecido. Esta inversão da EMT é conhecida como

transição mesenquimal­epitelial (MET, do inglês mesenchymal­epithelial transition, Figura 2.14). Essa conversão tem sido

observada em alguns estudos que demonstram que células tumorais disseminadas na medula óssea muitas vezes exibem um

fenótipo epitelial e que metástases a distância se assemelham a estruturas glandulares com o mesmo subtipo molecular de

seus respectivos tumores primários.

Figura 2.13 A transição epitélio­mesenquimal faz com que a célula converta seu fenótipo epitelial para o fenótipo

mesenquimal, diminuindo a expressão de proteínas epiteliais e aumentando a expressão de proteínas mesenquimais,

responsáveis pela motilidade da célula. Adaptada de Kalluri e Weinberg, 2009.

13

Sabe­se atualmente que esse comportamento das células neoplásicas é bastante influenciado pela interação com a matriz

extracelular, modulando a expressão de diferentes genes. A EMT é controlada por proteínas que interagem com receptores

específicos, muitos deles com atividade tirosinoquinase, que, além de atuarem nessa transição de fenótipos, podem atuar

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